sexta-feira, 20 de junho de 2014

Agentes penitenciários reclamam de situação de trabalho.


Presídios comportam 30 mil pessoas a mais do que a capacidade real e déficit de agentes chega a 2 mil servidores.

A audiência pública da Comissão de Direitos Humanos teve grande número de participantes
A audiência pública da Comissão de Direitos Humanos teve grande número de participantes - Foto: Ricardo Barbosa
As condições de trabalho dos agentes de segurança penitenciário do Estado foram discutidas em audiência da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quarta-feira (18/6/14). Entre os temas abordados estão a superlotação dos presídios, o número insuficiente de agentes penitenciários para suprir uma demanda crescente, a necessidade de reestruturação da carga horária de trabalho, bem como de uma legislação que pudesse doutrinar o sistema prisional do Estado e contemplar as reivindicações da categoria.
A discussão dessas questões foi motivada pelo caso do agente penitenciário João Alcides Cardoso de Freitas, lotado na Penitenciária do município de Francisco Sá (Norte de Minas), gravemente ferido em abril de 2013, quando fazia a escolta de quatro presos para atendimento médico. Segundo o deputado Cabo Júlio (PMDB), que solicitou a reunião, João Alcides era um dos cinco agentes envolvidos na operação. O parlamentar relatou que os agentes foram surpreendidos por pessoas que portavam armas como fuzil, carabina e granada, e que tentavam resgatar os detentos. João Alcides foi baleado, teve seu braço mutilado, além de sofrer fraturas expostas.
De acordo com Cabo Júlio, o agente não recebeu nenhum tipo de apoio do Estado e, ainda hoje, continua “abandonado”, já que todas as despesas com remédios e médicos são custeadas pelo próprio agente. O parlamentar classificou o fato de “covardia” e disse ser uma mentira a justificativa enviada pelo Estado que afirmava que João Alcides teria recebido todo o apoio e orientação necessários. “Estão jogando o servidor na vala comum, como se ele tivesse dado causa ao fato”, protestou Cabo Júlio.
João Alcides foi baleado, teve seu braço mutilado e sofreu fraturas expostas
João Alcides foi baleado, teve seu braço mutilado e sofreu fraturas expostas - Foto: Ricardo Barbosa
O parlamentar defendeu a aposentadoria de João Alcides, que, segundo relatórios médicos, teria um déficit funcional de forma definitiva, em função do acidente. O deputado ainda criticou o fato do servidor, que trabalhava dentro do sistema prisional, nunca ter recebido um treinamento específico para a escolta de presos e, ainda assim, ter sido escalado para o serviço. No decorrer da reunião, Cabo Júlio informou que o secretário de Estado de Defesa Social, Rômulo Ferraz, receberia o agente na tarde desta quarta (18) para discutir sua situação. O deputado deve acompanhar esta reunião em nome da comissão.
Ao relatar sua experiência, João Alcides se emocionou e disse que falar sobre o assunto ainda é, para ele, algo muito doloroso. “Resolvi servir ao Estado porque gosto, mas pensava que o servidor, quando acidentado, teria assistência”, denunciou o agente, ao falar sobre a falta de apoio recebido.
Ele também disse que, mesmo tendo o relatório de quatro ortopedistas que atestam que as suas sequelas são definitivas, deve passar por perícias médicas a cada dois meses. João Alcides falou que, atualmente, está com o braço inválido, perdeu os movimentos de uma das mãos, ainda tem estilhaços de bala em seu corpo, e faz uso de remédios psiquiátricos.
Assistência - Para o deputado Durval Ângelo (PT), casos de agentes penitenciários que se encontram em condições semelhantes a de João Alcides não são raros. Ele lembrou que tramita na ALMG o Projeto de Lei (PL) 1.353/11, de sua autoria, que trata da proteção, auxílio e assistência aos policias e bombeiros militares, policiais civis e agentes penitenciários do Estado. Segundo ele, o projeto, que aguarda para ser incluído em Ordem do Dia para votação em 2° turno no Plenário, prevê mais proteção para os servidores dessas carreiras, bem como um amparo médico, psicológico e social, nos casos comoo de João Alcides.
Parlamentares defenderam a proposta do PL 1.353/11
Parlamentares defenderam a proposta do PL 1.353/11 - Foto: Ricardo Barbosa
O deputado Sargento Rodrigues (PDT) também defendeu a proposta do PL 1.353/11, bem como uma “compensação mínima” para o agente ferido em serviço. Já o deputado Rogério Correia (PT) disse que o caso de João Alcides é muito grave, mas que a falta de assistência por parte do Estado tem acontecido também com outros trabalhadores do serviço público.
Estado - O superintendente de Segurança Prisional, Reginaldo Soares, reconheceu que o sistema prisional cresceu muito, mas a sua organização não ocorreu como deveria. Segundo, ele, a população carcerária do Estado é de 30 mil pessoas acima da capacidade real dos presídios e que o déficit de agente já chega a 2 mil profissionais. Ele também reconheceu que o treinamento recebido pelos agentes fica aquém do esperado.
Ele classificou o fato ocorrido com João Alcides como gravíssimo, mas ponderou que existe uma diretoria de assistência ao servidor, que na sua avaliação, precisa ser melhor estruturada.
Superlotação de presídios e falta de agentes são problemas pela categoria
O presidente da Associação dos Agentes de Segurança do Sistema Prisional e Socioeducativo do Norte de Minas - Montes Claros, Alexandre Figueiredo Cavalcante, denunciou como um dos principais problemas do sistema prisional do Estado a superlotação dos presídios, associada à falta de mão de obra e de capacitação dos agentes. “Reivindicamos melhorias, valorização e moralização do sistema prisional”, afirmou. Em entrevista, ele explicou que um dos mecanismos que poderia disciplinar o sistema seria a criação de uma Lei orgânica para o sistema prisional, que garantiria, por exemplo, benefícios como a auxílio invalidez e a aposentadoria especial.
Carga-horária - Outra reivindicação feita por vários agentes penitenciários foi com relação à carga-horária da categoria. Conforme esclareceu em entrevista, Cavalcante disse que a reivindicação é de que seja implementada uma carga de 12 horas de trabalho por 60 horas de folga. Atualmente, a jornada é de 12 horas trabalhadas por 36 de descanso, mas, segundo o presidente da associação, muitas vezes os agentes ultrapassam o tempo de trabalho estabelecido pela jornada.
Na avaliação do presidente do Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária do Estado, Adeilton de Souza Rocha, o agente penitenciário só é tratado como um servidor da área da segurança pública no momento dos deveres, mas não dos direitos.
O ouvidor do Sistema Penitenciário do Estado, Marcelo José Gonçalves da Costa, tomando o caso de João Alcides como exemplo, questionou o porquê da carreira do agente penitenciário ter que ser discutida sempre por meio de um caso de sofrimento e da carência.
Contratados – A situação de agentes penitenciários contratados também foi abordada por representantes da categoria na reunião. Sobre o assunto, os deputados Sargento Rodrigues e Cabo Júlio falaram, respectivamente, sobre os Pls 4.170/13 e 5.277/14, de autoria dos parlamentares e que tramitam na Casa, e que fazem alterações na Lei 18.185, de 2009, que dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Os dois projetos pretendem prorrogar os referidos contratos, o que beneficiaria os agentes penitenciários e socioeducativos.
Requerimentos – Foi aprovado requerimento do deputado Sargento Rodrigues para que fosse realizada audiência pública para debater denúncias de policiais militares quanto às suas condições de trabalho; do deputado Rogério Correia, para que seja realiza audiência para debater a saúde dos trabalhadores do serviço público do Estado e as violações dos direitos humanos; dos deputados Durval Ângelo, Sargento Rodrigues e Cabo Júlio, encaminhando as notas taquigráficas da reunião de quarta (18) para os convidados e pedindo esforços para garantir ao agente João Alcides o imediato e integral acesso ao atendimento de saúde necessário.
Fonte: ALMG

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